Capítulo 1 - VIAGEM INAUGURAL


PREFÁCIO

Saudações, amigos! Tudo bem?

Este é o ponto de partida da nossa jornada - nossa viagem inaugural, como o próprio título diz.
Neste primeiro capítulo, vamos ver um pouco dos personagens, a partir do momento em que a USS Frontier deixa a Terra rumo ao espaço - a fronteira final.
O que será que a tripulação da Frontier encontrará no início de sua viagem? É o que descobriremos nas próximas linhas!
Ao final, deixarei também algumas notas e referências.

Espero que todos gostem!
Deixem também seus comentários e compartilhem - será de grande ajuda!

Vida longa e próspera!


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Planeta Terra. Data Estelar 7501.1. 

Sete anos se passaram desde o retorno da Enterprise, após sua audaciosa e bem-sucedida missão de exploração pelo universo, liderada pelo capitão James T. Kirk. Seu nome agora é considerado uma lenda dentro da Frota Estelar.
Dentro deste período, a Frota foi lançando outras missões semelhantes pelo espaço, a fim de estreitar laços entre a Federação Unida dos Planetas e outros mundos, descobertos ou não.

Uma destas missões está prestes a se iniciar. Em uma sofisticada doca espacial em órbita da Terra, repousa uma nave estelar nova e recém-construída: a USS Frontier, registro de identificação NCC-1780. Trata-se de uma nave de classe Crossfield, muito semelhante a duas antecessoras de cerca de vinte anos antes: a USS Discovery e a USS Glenn.
A Frontier, no entanto, possui equipamentos de última geração e não tem a tecnologia experimental do motor de esporos, deixada de lado pela Frota Estelar após os incidentes ocorridos com a Discovery cerca de duas décadas atrás. (*)
E não somente a nave é nova: sua tripulação, em sua maioria, possui oficiais recém-promovidos pela Frota – é o caso do capitão Daniele Nardelli, chamado pelos seus mais próximos de “Dan”, que ocupa pela primeira vez em sua carreira o comando de uma nave estelar.
Dentro da ponte de comando da Frontier, ele realiza as últimas inspeções junto a seus oficiais:

- Como estão os sistemas de navegação, sr. Cortez?

Logo à frente do capitão, está o piloto designado para a nave, o jovem alferes Hernando Cortez. De imediato, ele reporta a situação a Dan:

- Todos os sistemas estão OK, senhor. Leme 100 por cento operante.

Ao lado do alferes Cortez, está sentado um sujeito peculiar, de cabelos prateados e orelhas pontudas como as dos vulcanos. É o tenente Andros – o refugiado romulano que se tornou o primeiro de sua raça a ingressar na Frota Estelar - chefe de segurança e oficial tático da Frontier. O capitão dirige sua atenção a ele:

- Sistemas táticos, tenente?

- Todos operacionais, senhor – responde Andros – Bancos phasers e torpedos fotônicos estão OK.

- Perfeito, sr. Andros – o capitão dirige-se à sua cadeira e aperta um botão para se comunicar com um outro setor da nave – Engenharia?

Do outro lado da linha, uma voz com sotaque africano responde ao chamado do capitão:

- Aqui é Okonwa, capitão.

- Qual é o status dos motores, sr. Okonwa?

De dentro do deck da engenharia, um homem negro, com o cabelo um pouco armado e cavanhaque, responde ao chamado do capitão. É o tenente-comandante Eugene Okonwa, engenheiro-chefe da Frontier:

- Tanto os motores de dobra quanto os de impulso estão em pleno funcionamento, senhor, assim como os sistemas de energia e de suporte de vida. O coração desta nave está pulsando!

Ao ouvir estas palavras, o capitão abre um sorriso de satisfação, percebendo a empolgação de seu engenheiro-chefe.

- Muito bem, sr. Okonwa. Deixe-os de prontidão, partiremos em alguns minutos. Desligo.

Em seguida, Dan se volta para um oficial sentado logo à sua direita, um rapaz branco de cabelo escuro, cavanhaque e com um fone em sua orelha esquerda. É o tenente Dejan Stanic, oficial encarregado das comunicações da nave:

- Sistemas de comunicação, sr. Stanic?

- Todas as frequências operantes, capitão. Sistemas de comunicação em ordem.

- Muito bem. - Pouco depois de ouvir estas palavras de Stanic, Dan entra em contato com outro setor da nave, a partir de sua cadeira de capitão.

- Nardelli para Enfermaria.

- Aqui é Lester – responde uma voz do outro lado da linha, com um ligeiro sotaque britânico.

- Doutor, nós partiremos em questão de instantes. Como estão as coisas por aí?

Na Enfermaria, encontra-se um rapaz louro, de olhos azuis claros, a barba ligeiramente por fazer, trajando um uniforme branco com detalhes em dourado, semelhante ao dos outros oficiais. Sua insígnia no peito contém em seu centro uma cruz na cor vermelha, característica de profissionais de medicina. É o médico-chefe da Frontier, doutor Jonas Lester, que logo trata de responder ao questionamento do capitão: 
- Por enquanto está tudo tranquilo, capitão. Meus sistemas estão operantes e, por enquanto, nenhuma ocorrência.

- OK, doutor. Fique de prontidão. Desligo.

O capitão faz uma pausa.

- Bom, ao que tudo indica, estamos prontos – conclui o capitão. – Sr. Cortez, solicite autorização ao comando da doca para manobrar. Mantenha-me informado.

- Sim, senhor.

Ao transmitir esta ordem, Dan olhou em volta da ponte. Observou que quase todos os oficiais principais estavam em seus postos, mas sentiu uma ausência significativa nos momentos que antecedem ao lançamento da Frontier:

- Onde está a srta. Hong?

Após fazer-se esta pergunta, o capitão dirigiu-se a porta do turbo-elevador. Antes de chegar a ela, foi interrompido por uma sugestão do sr. Stanic:

- Quer que eu abra um canal e solicite a presença dela à ponte, capitão?

- Não será necessário, sr. Stanic – responde Dan. – Eu mesmo cuidarei disso, pode ficar tranquilo. Voltarei em alguns minutos.

- Como desejar, senhor.

Instantes depois, vemos o capitão desfilando pelos corredores da nave. Alto, de cabelos curtos e bem escuros, olhos castanhos, um certo ar italiano, trajando elegantemente o uniforme de comando da Frota Estelar: uma indumentária predominantemente azul escura (à exceção das botas, que são pretas), composta por uma calça e uma blusa com detalhes em dourado nos ombros.
No lado esquerdo do peito, a insígnia da Frota Estelar, em dourado, com o símbolo de comando em seu centro (uma estrela com a ponta superior esticada) e quatro pequenos círculos no canto inferior esquerdo, que indicam sua patente de capitão.
Uns poucos metros à frente, diante de uma janela no corredor, surge uma figura em estado de introspecção: uma oriental de aparência jovem, rosto arredondado, nariz um pouco pequeno, cabelos longos, lisos e castanhos presos em rabo-de-cavalo, e um uniforme muito semelhante ao do capitão, à exceção de sua cor predominantemente verde escura e da insígnia da Frota em seu peito, que contém o símbolo de ciência (um círculo dividido em três gomos) e três círculos menores no canto inferior esquerdo – patente de comandante, uma abaixo do capitão.
É a oficial de ciências e primeira-oficial da Frontier, Seul-gi Hong.

Hong devia estar ali há algum tempo, observando a órbita da Terra pela janela do corredor. O olhar dela transmite uma expressão tímida, reflexiva, aparentemente até um pouco tristonha. Costuma falar pouco, mas se dá melhor com o capitão, de quem é amiga de longa data.
Ela olha para o lado e é surpreendida pela aproximação de Dan.

- Capitão...? – a voz da primeira-oficial sai em um tom suave e baixo, quase inaudível.

- Está tudo bem, Seul-gi? – Dan esboça um sorriso enquanto dirige-lhe a palavra.

- Sim, não é nada de mais, Dan – Hong volta seu olhar para baixo com um riso tímido. – É que mesmo depois de tanto tempo no espaço, acho que ainda não me acostumei. Ainda é um pouco estranho pra mim ver a Terra de cima.

- Isso é natural. Às vezes, quando retornava de uma missão, também me sentia desse jeito. Cada um reage à sua maneira.

- E agora você é capitão de uma nave estelar. Eu já imaginava que um dia você chegaria a esse posto, mas... como você está lidando com isso?
- Da melhor forma possível. O Comando da Frota Estelar confia em mim. Logo, terei que fazer o meu melhor para o sucesso desta missão. E eu acredito que eu sou capaz.

- Queria ter toda essa sua autoconfiança...

- Você também tem se saído bem, Seul-gi. Quando te recomendei ao Comando da Frota, eles fizeram comentários muito bons a seu respeito. Claro, eu tive que insistir um pouco, mas no final deu tudo certo. Afinal de contas, eu precisava cumprir a minha promessa, não é verdade?

Seul-gi abriu um sorriso ao ouvir estas palavras do capitão.

- Eu nem acredito que enfim faremos uma missão juntos! Achei que nunca mais ia te ver depois da Academia!
 
- Tanto eu quanto você trabalhamos para um dia chegar até aqui. Devia se orgulhar de si mesma. E eu costumo cumprir as coisas que prometo, você já devia saber disso!

Seul-gi, então, lança uma pergunta que deixa Dan intrigado. E lisonjeado, ao mesmo tempo.

- Quer ser grande como James Kirk?

Um pouco sem graça, Dan solta uma risada e responde:

- Quem me dera! O almirante Kirk é uma lenda viva. Se eu conseguir metade do que ele conseguiu, então eu estou feito!

- Fiquei sabendo que ele está de novo viajando pelo universo à frente da Enterprise. (**) – afirmou Seul-gi. - Ele é incansável!

- É por isso que ele tem a minha admiração...

Os dois sorriem alegremente um para o outro. Em seguida, Dan pousa suavemente sua mão direita sobre o ombro esquerdo de Seul-gi, e transmite sua ordem:

- Vá assumir seu posto. Nós já vamos partir.

Com um sorriso um pouco tímido no rosto, a comandante Hong faz um sinal de afirmação com a cabeça.

Dan  retorna à ponte de comando, acompanhado da comandante Hong, que assume seu posto em uma plataforma situada à direita da cadeira do capitão, próxima à plataforma de comunicações, onde se encontra o tenente Stanic.
O próprio Stanic anuncia ao restante da ponte a chegada do capitão.

- Capitão na ponte!

- A central de comando da doca nos autorizou a manobrar, capitão. Podemos partir quando o senhor desejar – afirmou Cortez.

- Muito bem, sr. Cortez. Aguarde o meu sinal – o capitão então se volta para Stanic. – Sr. Stanic, abra um canal para toda a nave.

Imediatamente, Stanic aperta alguns botões em seu painel e abre a frequência.

- Canal aberto, senhor.

- Obrigado.

Então, Dan inicia um pronunciamento dirigido à toda a tripulação da Frontier, sob o olhar de todos os oficiais da ponte de comando, e os ouvidos atentos dos tripulantes espalhados por cada canto da nave:

- Aqui é o capitão. Dentro de alguns instantes, partiremos com a Frontier rumo aos confins do universo. Creio que muitos de vocês devam estar ansiosos, pois para a grande maioria, esta será a primeira missão a bordo de uma nave da Federação.
Acreditem, vocês não são os únicos... eu também estou bastante ansioso, pois é minha primeira missão como capitão de uma nave estelar.

O capitão faz uma pausa e suspira por um instante. Mas trata de retomar seu discurso logo em seguida.

- Estou ciente de minhas obrigações e minhas responsabilidades, e acredito que todos vocês também estão cientes das suas. Mas não vamos permitir que isto se torne um peso pra nós, muito pelo contrário: vamos fazer com que isto nos impulsione! Pensem... quantos outros lá atrás estiveram onde vocês estão agora, e hoje ocupam altos postos dentro da Frota Estelar? Será que mais de uma década atrás, o grande James Tiberius Kirk, que hoje é almirante da Frota, não sentiu a mesma ponta de ansiedade que sinto agora, quando se sentou pela primeira vez na cadeira de comando da Enterprise?

A cada palavra do capitão, um brilho nos olhos de todos na nave vai surgindo pouco a pouco. Desde os oficiais na ponte, os engenheiros, os médicos da enfermaria, até os oficiais de segurança, os cientistas, os cadetes. Os corações de todos se enchem de entusiasmo.

- O que eu quero dizer – continuou Dan – é que um dia, todos aqueles que hoje ocupam lugar de destaque já foram como vocês, como eu, como nós: começaram de algum lugar. Tudo tem um ponto de partida. Se todos nós trabalharmos com afinco, nos dedicarmos, ajudarmos uns aos outros e principalmente acreditarmos em nós mesmos, eu tenho certeza que esta missão será mais do que bem-sucedida. E todos nós daremos saltos gigantescos em nossas vidas.
Saibam que eu acredito em cada um de vocês. E acredito também que honraremos com louvor aquela que sempre foi a grande missão da Frota Estelar: ir audaciosamente onde ninguém jamais esteve!

Emocionado, o alferes Cortez enxuga as lágrimas do seu rosto e começa a bater palmas lentamente, aplaudindo as palavras do capitão. Em seguida, Stanic, Hong, Andros e todos os outros oficiais da ponte começam a fazer o mesmo. Em questão de instantes, toda a Frontier é tomada por um estrondoso aplauso vindo de todos os seus 450 tripulantes. Ao ver tudo isso, Dan sorri de satisfação – enquanto a senhorita Hong, sua primeira-oficial e grande amiga, olha para ele emocionada, com os olhos marejados e um largo sorriso no rosto.

Passada toda a euforia do discurso, o capitão dá a ordem de partida ao alferes Cortez:

- Acione os motores e inicie as manobras, sr. Cortez. Força de 1/4 de impulso à frente.

- 1/4 de impulso à frente, capitão – Cortez logo trata de acatar a ordem, apertando alguns botões do painel do leme e acionando os motores de impulso da nave, na proporção necessária para as manobras.

"Acione os motores e inicie manobras, sr. Cortez. 1/4 de impulso à frente."

A USS Frontier, então, começa a se mover dentro da doca. Pouco a pouco, a nave vai avançando rumo aos portões para tomar o espaço aberto.
O capitão, enquanto isso, aproveita estes instantes para fazer seu registro no diário de bordo.


“Diário do Capitão – Data Estelar: 7501.1 Após meses de testes e de preparação da tripulação, a Frontier, enfim, segue rumo ao espaço em sua viagem inaugural.
Para mim, este é um momento muito especial, pois esta missão não será como as outras das quais tomei parte, uma vez que agora sou eu quem está no comando – e este é um momento que eu sempre almejei dentro da Frota Estelar.
O que vou encontrar nesta missão? Ninguém sabe ao certo. No entanto, posso afirmar que tanto eu quanto minha tripulação estamos muito confiantes.”


Os portões da doca, então, se abrem. Lentamente, a Frontier deixa o complexo e toma a órbita da Terra.

- Deixamos o complexo da doca espacial, capitão – sinaliza o alferes Cortez.

- Impulso total, sr. Cortez.

Novamente, Cortez mexe no display do leme, para que a nave ganhe uma velocidade maior:

- Impulso total, senhor.

A Frontier alcança uma velocidade maior, quase saindo de órbita.

- Condições para velocidade de dobra em 60 segundos – aponta Cortez.

- Firme no curso, alferes – responde Dan.

A nave se afasta ainda mais da órbita da Terra, quase atingindo o espaço aberto. Os 60 segundos mencionados pelo alferes Cortez se passam quase como em um piscar de olhos. Ele inicia uma contagem regressiva para colocar a nave em velocidade de dobra:

- Condições para velocidade de dobra em 10 segundos... 9... 8... 7... 6... 5... 4... 3... 2... 1...

A cada número da contagem, a expectativa dos oficiais da ponte aumenta. Todos observam o jovem piloto com atenção. Ao final da contagem, Cortez sinaliza ao capitão, que por sua vez, dá a instrução final:

- Campo de dobra estável, capitão.

- Muito bem, sr. Cortez. Pode nos tirar de órbita. À frente, fator de dobra 1.

Cortez digita rapidamente no painel do leme.

- Dobra 1, senhor.

Enfim, a Frontier ganha o espaço aberto, entrando em velocidade de dobra – as naceles da nave, dois grandes e longos cilindros em cada lado, brilham com intensidade, e a nave, então, dispara adiante em uma velocidade monumental, quase desaparecendo, deixando apenas um ligeiro rastro luminoso no caminho.
Quando a nave alcança o horizonte do espaço, um rápido e intenso clarão se forma, aparecendo e desaparecendo em milésimos de segundo.

Com a Frontier já cruzando o espaço em dobra, a sensação dentro da nave é de alívio. A expectativa da partida enfim passou, e toda a tripulação é tomada por um sentimento de satisfação e de alegria.
Trajando um uniforme azul de comando muito parecido com o do capitão, mas com apenas um círculo na parte inferior de sua insígnia da Frota, que indica sua patente como alferes, o jovem Hernando Aníbal Cortez, um espanhol de 22 anos de idade, cabelos um pouco curtos e castanhos e o nariz ligeiramente avantajado – o que não tira seu charme hispânico – solta um suspiro de alívio à frente do leme. Recém-graduado pela Academia da Frota Estelar, Cortez estava em sua primeira missão como oficial de uma nave:

- Hostia! (***) Acho que nunca estive tão nervoso em toda a minha vida! Nem acredito que consegui!

- Você se saiu muito bem, Hernando – o capitão dá uns tapinhas nas costas de Cortez. – Não é à toa que é considerado um dos pilotos mais promissores da Frota Estelar. Você mais parecia um veterano manobrando a nave na doca, meus parabéns!

- É muita gentileza sua, capitão – responde Cortez, lisonjeado. – Pilotar uma nave estelar sempre foi o meu sonho, e estudei muito pra isso enquanto estive na Academia. Graças ao senhor, este sonho agora é uma realidade! Farei o melhor que eu puder durante esta missão!

- Eu acredito, sr. Cortez. Você será um grande piloto!

O alferes sorri de alegria e satisfação ao ouvir estas palavras de Dan.

Quase uma hora depois, na enfermaria da nave, o doutor Jonas Lester está sentado em sua mesa, mexendo em um computador – está se familiarizando com os sistemas que utilizará dali em diante. Subitamente, ele ouve a campainha tocar.

- Entre – diz o doutor, em voz alta.

A porta automática se abre, e revela quem está por trás dela. É o capitão.

- Ah, é você, Dan! – o doutor se surpreende com a visita de Nardelli.

- Como estão as coisas por aqui, doutor? – pergunta Dan.

- Por enquanto nada de anormal – responde Lester. – Só um tripulante que passou mal sentindo enjoos depois da decolagem, mas nada muito sério. Ministrei uma dose de metoclopramida e recomendei repouso. Ele já foi para os aposentos dele, deve estar bom em alguns dias.

- Como é que ainda tem gente que fica enjoada em uma viagem espacial? – questiona o capitão, surpreso – Em toda minha vida nunca passei por isso.

- Cada organismo é diferente de indivíduo pra indivíduo – diz o doutor. – Consequentemente, cada um reage de um jeito. Não são todos que se adaptam facilmente a viagens pelo espaço.

- Compreendo...

O doutor Lester, então, muda o tom da conversa, e adota um tom mais informal. Assim como Hong, ele também é um amigo muito próximo de Dan, dos tempos da Academia da Frota Estelar.

- E você, Dan? Como está se sentindo? – pergunta Lester, esboçando um sorriso – Pelo jeito, não vai demorar muito para você se adaptar à sua nova condição. Seu discurso antes da partida da Frontier foi inspirador!

- Obrigado, Jon – o capitão pega uma cadeira e se senta próximo do doutor – Ainda é tudo novidade pra mim. Mas acredito que com o tempo eu pego o jeito. Ser capitão de uma nave estelar não é fácil, mas também não é impossível.

- Acredite, Dan, você nasceu pra isso! Só aquele seu discurso diz tudo. Tenho certeza que você será um grande capitão, posso sentir!

- Você diz isso porque é meu amigo... – o capitão sorri, com o rosto um pouco corado de vergonha. 

Os dois caem na risada. O doutor, então, resolve mudar de assunto.

- A propósito, Dan... e a comandante Hong? Como ela está lidando com tudo isso? Pra ela tudo deve ser tão novo quanto é pra você...

- Ela também está se adaptando. Até ela se acostumar, é uma questão de tempo.

O dr. Lester, então, resolve botar um pouco de lenha na fogueira. E acaba deixando o capitão sem jeito.

- E como está indo com ela? Acredito que você deva estar feliz... afinal, você quase implorou ao Comando da Frota Estelar para que ela fosse sua primeira-oficial!

- Ora, Jon, que é isso! – Dan começa ligeiramente a rir de nervoso – Eu estou feliz, é claro! Seul-gi é uma amiga muito especial pra mim, do mesmo jeito que você é. E além de tudo, ela merecia o posto!

- Deixe de conversa, Dan! Você nunca tirou os olhos dela, desde os tempos da Academia! Sem falar que até se graduarem, vocês não se desgrudavam! Acredite em mim, vocês foram feitos um para o outro!

- Não exagere... nós dois somos apenas bons amigos... 

- “Bons amigos”... – o doutor acrescenta uma ponta de ironia em sua voz – Essa eu pago pra ver! Até o final desta missão, vocês vão juntar os trapinhos, meu amigo. Anote o que estou lhe dizendo!

Ainda rindo, o capitão resolve deixar a enfermaria. Levanta-se de sua cadeira e se despede de Jon, que se volta para seu computador.

- Bom, doutor, acho que vou deixa-lo à vontade. Me avise se precisar de algo.

- Sempre às ordens, capitão! – o doutor Lester se despede com um sorriso e toda a sua elegância britânica.

O capitão, então, deixa a enfermaria saindo pela porta automática.


Em um outro ponto da nave, está Seul-gi Hong. Mais especificamente, aquela janela no corredor onde ela estava antes da nave partir. Reflexiva, ela olha através da janela: do outro lado, vê-se as estrelas se esticando horizontalmente, como em um rastro – uma ilusão de ótica, consequência da movimentação da Frontier em velocidade de dobra.
Dan se aproxima e também começa a olhar para a janela, ao lado de Seul-gi:

- Fascinante, não é? – o capitão dirige-se a Seul-gi esboçando um sorriso.

- Sim – responde a primeira-oficial. – E bonito. Eu costumava olhar as estrelas quando eu era criança... mas nada se compara a isto. Estar entre elas, viajar entre elas... é indescritível.

Os dois ficam em silêncio por alguns segundos, se olhando e trocando sorrisos contidos. Seul-gi logo trata de quebrar esse silêncio, e dá continuidade à conversa com o capitão:

- Você me emocionou com o seu discurso. Tive que me segurar pra não chorar na ponte... – Hong ri, de maneira tímida.

- Acha que comecei bem? – pergunta Dan.

- Se eu acho? Eu tenho certeza! Você será um dos melhores capitães da Frota Estelar, eu posso sentir!

Sem jeito, Dan começa a rir baixo.

- Minha jornada só está começando, Seul-gi. É muito cedo pra falar qualquer coisa, não posso criar expectativas...

- Não fale assim. Você é dedicado, tem se esforçado desde os tempos da Academia... vai dar tudo certo, eu acredito em você.

Os dois sorriem um para o outro. Seul-gi muda de assunto.

- Já foi ver o dr. Lester?

- Sim. Estive com ele na enfermaria há pouco. Ele está bastante tranquilo, pelo que eu pude ver.

- Ele é um ótimo médico. Você fez bem de trazê-lo à tripulação.

- Não foi fácil construir esta equipe... o Comando da Frota fez muitas exigências no início, mas fiz um esforço para trazer não apenas oficiais talentosos e capacitados, mas principalmente, pessoas em quem confio. Você e o doutor são algumas dessas pessoas.

Novamente, um silêncio momentâneo, com sorrisos estampados em ambos os rostos.

- Fico feliz por você se lembrar de mim – disse Seul-gi.

- Eu te disse naquele dia na Academia que se um dia eu fosse capitão de nave estelar, você seria minha primeira-oficial, lembra? – disse Dan – Pois então...

Na ponte, o alferes Cortez resolve puxar assunto com o tenente Andros, que está sentado ao seu lado no painel do leme. O uniforme usado pelo romulano é o uniforme de operações, predominantemente vermelho, e em sua insígnia da Frota Estelar estão o símbolo de operações (uma espiral segmentada) no centro e dois pequenos círculos na parte inferior , indicações de sua patente de tenente.
Por estar uma patente abaixo, Cortez dirige-se a ele de forma respeitosa.

- Permissão para falar livremente, tenente?

- Esteja à vontade – responde Andros, com um sorriso cordial no rosto e levantando sua sobrancelha esquerda.

- Me desculpe a indelicadeza – inicia Cortez - mas é que eu nunca tinha falado com um romulano antes. Mas até onde sei, você tem uma condição excepcional... você é um refugiado, certo?

- Exatamente. Eu vivo no espaço da Federação sob asilo. Não foi fácil de conseguir, mas graças aos deuses, o Conselho da Federação ouviu meu apelo e me deu condições para viver na Terra.

- Puxa, não deve ser nada fácil pra você, não é? Quer dizer, ser obrigado a viver em um lugar a centenas de anos-luz de casa, com uma cultura diferente, e tudo o mais... sei lá, acho que eu não ia dar conta! Com certeza eu ia surtar depois de um tempo...

Andros solta uma risada descontraída ao ouvir o comentário de Cortez.

- É, pode até ser. Mas ao menos na Terra eu tenho uma coisa que eu não tinha em Romulus.

- É mesmo, é?! – Cortez lança em Andros um olhar intrigado. – E o que é?

- Liberdade – o romulano responde sem pestanejar. – Na Terra as pessoas pensam e agem da maneira que bem entendem. Em meu planeta infelizmente as coisas não são assim...

O alferes se surpreende com as revelações de Andros.

- Puxa vida, sério?! Bom, aí realmente a coisa muda de figura... mas vem cá, você não sente saudade de casa de vez em quando, não?

- Às vezes eu sinto falta de uma coisa ou outra – responde o tenente. – Tive que deixar muitas coisas pra trás quando fugi de Romulus: amigos, família... Mas não me arrependo.

- Estou impressionado! – exclama Cortez. – Você ganhou a minha admiração, tenente!

Andros sorri para o jovem espanhol. Parece estar entretido pela conversa.

- Fico agradecido, alferes.

Foi então que os dois se depararam com algo na tela principal da nave que os pegou de surpresa. E deixou os olhos de ambos arregalados.

- Mas o quê...?! – exclamou Andros.

- Que cojones é aquilo?!? – reagiu Cortez, boquiaberto.

O capitão ainda está na janela do corredor conversando com Seul-gi, quando os dois são surpreendidos pelo som de um apito vindo de um terminal de comunicação, na parede do outro lado do corredor. Do outro lado da linha, se ouve a voz do tenente Andros:

- Ponte para capitão!

Dan imediatamente avança para o terminal, aperta um botão e responde o chamado.
- Aqui é Nardelli. Prossiga, tenente!
- Capitão, venha para a ponte imediatamente! Nos deparamos com algo suspeito próximo da nave!
- Entendido. Estou a caminho!
De imediato, o capitão volta-se para Hong:
- Vamos!
Seul-gi faz um sinal de afirmação com a cabeça. E os dois saem correndo em direção ao elevador.


Rapidamente, o capitão e a comandante Hong chegam à ponte. O tenente Stanic anuncia sua chegada aos demais oficiais:
- Capitão na ponte!
Hong assume seu posto na plataforma, enquanto o capitão vai para sua cadeira. De imediato, ele questiona o tenente Andros:
- O que aconteceu, tenente?  
Andros relata a Dan o que ele e o alferes Cortez viram. 
- Detectamos uma nave suspeita próxima de nós, senhor!
O capitão se surpreende com a revelação do tenente. Então, dirige-se a Cortez:
- Saia da velocidade de dobra, sr. Cortez. Parada total.
- Deixando velocidade de dobra, capitão – responde o alferes.
Um clarão se faz em meio ao espaço, e dele sai a Frontier, que para no ar de maneira quase brusca. A nave saiu da dobra espacial.
- Localização da nave suspeita, sr. Andros? – pergunta o capitão.
- Está a uns 10 mil quilômetros da nossa posição atual, senhor. Direção 227, marco 13.
- Entendido, tenente. Sr. Cortez, coloque na tela.
- Sim, senhor!
Cortez coloca na tela a imagem da tal nave. Surge então, a imagem de uma nave com um design bastante peculiar: duas longas asas triangulares, ligeiramente inclinadas para baixo com longos cilindros em suas extremidades; do meio delas, projeta-se para a frente um outro cilindro, mais longo que os das asas, com uma esfera na extremidade – a nave se assemelha muito a um enorme pássaro em pleno voo. A visão desta nave deixa Dan estupefato.
- Só pode estar de brincadeira...
Não só o capitão, mas todos os oficiais presentes na ponte de comando ficam surpresos ao ver a imagem da estranha nave na tela. Dan, então, volta-se para a comandante Hong:
- Não, não pode ser... Confirme a identidade dessa nave, srta. Hong! – ordena, com uma tensão evidente na voz.
- Escaneando, capitão... – prontamente, Seul-gi aciona um display em sua plataforma que projeta uma pequena imagem holográfica da nave intrusa enquanto o computador processa os dados, cruzando informações com os bancos de dados da Frota Estelar.
Após alguns segundos, o resultado do escaneamento sai. Hong o informa ao capitão, confirmando as suspeitas iniciais dele e deixando os outros oficiais da ponte boquiabertos... pois o resultado é aterrador. 
- Cruzador de batalha classe D7. É uma nave Klingon.
- Como imaginei – responde Dan. No entanto, ele percebe que há algo errado; a primeira coisa que ele faz é questionar o alferes Cortez sobre a localização.
- Sr. Cortez, ainda estamos no espaço da Federação?
- Precisamente, senhor – responde o alferes. – Nossa posição está a cerca de seis anos-luz da Zona Neutra Klingon.
Ainda estranhando toda a situação, o capitão chega a uma conclusão, ainda que imprecisa.
- Então tecnicamente eles estão violando o nosso território... – Dan faz uma pausa e decide colocar a nave em estado de atenção. – Alerta amarelo! Erguer defletores, sr. Cortez!
Rapidamente, Cortez digita em seu display de controle do leme e aciona os escudos.
- Defletores erguidos, senhor!
Andros percebe alguma coisa na nave Klingon. Vê uma fumaça escura saindo de um dos cilindros, na asa esquerda da nave. Imediatamente, chama a atenção do capitão:
- Capitão, parece que a nave Klingon está com problemas. Veja os motores de dobra deles!
- O que disse, sr. Andros?! – responde Dan, surpreso – Sr. Cortez, amplie a imagem!
- Ampliando imagem, senhor.

Novamente, Cortez aciona dispositivos em seu display. A imagem é ampliada e revela detalhes ainda mais enigmáticos: na asa esquerda da nave Klingon, pode-se notar um buraco todo chamuscado em volta, emitindo uma fumaça cinzenta. Uma boa parte desta asa e também da outra também estão bastante chamuscados – o que sugere que a nave pode ter sofrido um ataque recente.

- Parece que os motores de dobra deles foram bastante danificados, capitão – relata o alferes Cortez, ao ver as imagens mais detalhadas. – Há avarias também por toda a extensão da nave!

Ninguém parece entender o que está acontecendo. Dan fica com uma pulga atrás da orelha: o que aquela nave Klingon estaria fazendo ali, fora de seus domínios? Pelo Tratado de Orgânia (****), os Klingons não poderiam deixar seu território e entrar no espaço da Federação sem que haja uma boa razão para tal; e ainda, sem comunicação prévia. Mas quem seria o responsável pelo ataque à nave? Será que os Klingons cometeram um ato de guerra, e sofreram algum tipo de retaliação de alguma nave da Federação? Será que outra guerra entre a Federação e o Império Klingon estaria prestes a começar, mesmo com um tratado de paz em vigência? Dan fica com mais perguntas do que respostas em sua mente.

- O que diabos está acontecendo aqui?! – pergunta, com um tom de nervosismo na voz, e a imagem da nave Klingon avariada diante de si.

"O que diabos está acontecendo aqui?!"


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NOTAS DO AUTOR:

(*) Vide Star Trek: Discovery - Temporada 1

(**) Vide Jornada nas Estrelas - O Filme (1979); a trama de Frontier se passa um pouco depois do primeiro filme, e bem antes de A Ira de Khan (o segundo filme, lançado em 1982).
Vale ressaltar que a linha do tempo do universo de Star Trek não é muito precisa, pelo menos antes dos fatos apresentados na série A Nova Geração.

(***) Nota cultural: "hostia" é uma interjeição típica espanhola. Não tem uma tradução exata, é como se fosse um "caramba" ou algo do tipo pra nós brasileiros.

(****) Vide Jornada nas Estrelas/Star Trek: The Original Series - Temporada 1 Ep. 27: "Missão de Misericórdia" ("Errand of Mercy")

História também disponível no Spirit Fanfics.

Comentários

  1. Parabéns ..muito bem descrito e interessante!!

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  2. Nao tem o bloco para seguir assim quando postar algo novo recebemos aviso
    Em tempo parabéns

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    Respostas
    1. Corrigido - logo abaixo do cabeçalho agora tem um botão do FeedBurner. Só clicar nele e vc passará a receber as novidades por email.
      Grato pela dica!

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  3. Adorei. Ansiosa para a continuação. Parabéns

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  4. Muito bom! Adorei! Mal posso esperar pela continuação! Vice escreve super bem 😉 E já estou torcendo pelo futuro casal Dan-Hong!

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